quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Reabertura das escolas: o que podemos aprender com a experiência de outros países na pandemia.

Mais de 1,5 bilhão de crianças e jovens foram afetados pelo fechamento das escolas em mais de 190 países desde o início da pandemia. Equivalente em angústia ao desafio do ensino remoto trazido pelo novo coronavírus, somente a perspectiva da retomada das aulas presenciais. Quando e como reabrir as escolas para esses estudantes? Como garantir a saúde de professores e alunos? O quanto o distanciamento social afetou a saúde mental? De que forma garantir o direito à aprendizagem e recuperar conhecimentos daqueles que não tiveram acesso ao ensino remoto?


No Brasil, governadores, prefeitos e organizações ligadas à Educação e à saúde pública estão discutindo a volta às aulas neste momento. Com o país ainda atravessando o pico da pandemia, não está claro se reabrir as escolas em setembro ou outubro será seguro. Uma simulação feita para o estado de São Paulo apontou que a reabertura seria segura com um limite de 20% dos alunos em aulas presenciais. E os outros 80%? Continuariam com as aulas no ensino remoto? 

A discussão dos protocolos necessários para a reabertura das escolas, que consta em artigo publicado no site oficial da Organização das Nações Unidas (ONU), orientou a experiência de vários países – e pode nos ajudar a encontrar apontamentos a partir de erros e acertos.


Os desafios na visão da ONU

O artigo da ONU destaca o cenário complexo causado pela evolução da pandemia em diferentes estágios ao redor do mundo. A preocupação com a interrupção das atividades escolares está diretamente relacionada às desigualdades educacionais entre países ricos e pobres – e se espelha dentro dos estratos da sociedade. “O fechamento das escolas acarreta altos custos sociais e econômicos para as pessoas nas diferentes comunidades”, comenta Vera Capellini, professora do departamento de Educação da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Bauru (SP). “O impacto, porém, é particularmente grave para os meninos e as meninas mais vulneráveis e marginalizados, assim como para suas famílias”.

Veja a seguir como foram as experiências em alguns países e o que podemos aprender com elas.

Israel: abertura traumática

Na primeira etapa da pandemia no país, entre março e abril, Israel realizou um trabalho competente no controle do número de casos da Covid-19, que incluiu fechamento de fronteiras e a interrupção de atividades presenciais em empresas, estabelecimentos e escolas.

Em maio, o governo optou por retomar as atividades em muitas frentes – como hotéis, bares, restaurantes e locais de culto religioso –, incluindo as aulas em todas as escolas. Veio o caos: um dos colégios de maior prestígio em Jerusalém, Gymnasia Ha'ivrit, identificou dois casos. A escola optou por fechar e recomendar isolamento, além de iniciar uma testagem em massa que levou a um resultado surpreendente: 178 pessoas (153 estudantes e 25 profissionais) foram contaminadas pelo novo coronavírus.

Casos foram registrados em outras escolas e, em pouco tempo, aproximadamente 250 instituições de ensino israelenses precisaram fechar novamente. Uma análise de especialistas identificou alguns pontos que colaboraram para o surto em Israel:

- Três dias depois da reabertura das escolas, com uma onda de calor com temperaturas batendo mais de 40 graus, o governo liberou que os alunos não utilizassem máscaras por três dias
- Na escola que foi o primeiro foco de infecção, o número de alunos por sala de aula superava 30, quantidade acima da recomendável por órgãos especializados
- Houve uma desatenção ao distanciamento social e à ventilação dos ambiente.

Não existe um consenso se foi a reabertura das escolas que ocasionou o surto de Covid-19, mas ainda assim é possível retirar alguns apontamentos dessa tentativa. “O meu entendimento da experiência de Israel é que não podemos relaxar nas medidas de segurança, enquanto não houver uma vacina”, afirma Tatiana Filgueiras, vice-presidente de Educação e Inovação do Instituto Ayrton Senna. “É muito importante que as medidas básicas – uso de máscara, lavagem das mãos, distanciamento social – sejam mantidas”.

O fato enfatiza um alerta que vem sendo expressado por professores e epidemiologistas. “Ainda que tenhamos prejuízos acadêmicos, a vida deve estar em primeiro lugar. Enquanto não tivermos uma vacina, penso que seja pouco provável que as escolas consigam administrar um retorno às aulas presenciais com segurança”, afirma Vera Capellini.

China: protocolos rígidos

Na China, epicentro da pandemia do novo coronavírus, as escolas ficaram quatro meses fechadas. O retorno foi progressivo, entre abril e maio, e dividido por províncias e por faixas etárias dos estudantes – com priorização para alunos do Ensino Médio.

Os protocolos chineses para reabertura estabeleceram diversos requisitos:

- Só podem reabrir escolas localizadas em regiões sem nenhum caso de contaminação nos últimos 14 dias;
- Todos os alunos e funcionários passam por medição de temperatura diariamente pela manhã;
- As escolas distribuem máscaras, luvas e desinfetantes de mãos para todos os alunos e funcionários;
- Os espaços da escola passam por uma desinfecção diária;
- Os professores devem oferecer acolhimento emocional aos alunos;
- As escolas devem manter um mapeamento detalhado da situação epidemiológica; caso sejam confirmados novos casos, autoridades precisam ser notificadas e o isolamento social deve ser recomendado.

Coreia do Sul: retomada gradual

Considerada um dos países que melhor lidou com a pandemia, a partir da sua política de testagem em massa, a Coreia do Sul iniciou a reabertura das escolas no final de maio. Da mesma forma que a China, esse retorno foi gradual e começou pelos alunos do Ensino Médio.

As exigências da reabertura sul-coreana foram similares às chinesas:

- Uso obrigatório de máscaras em toda a escola;
- Escalonamento dos horários de aulas e intervalos;
- Medição da temperatura de alunos e funcionários da escola diariamente pela manhã;
- Regras claras de distanciamento social; os alunos se sentam sozinhos em mesas que anteriormente abrigavam dois estudantes.

Apesar de todo esse cuidado, houve alguns problemas: escolas da região da capital Seul precisaram fechar poucos dias depois da reabertura, enquanto mais de cem tiveram que adiar a reabertura, pois dois estudantes foram diagnosticados com o novo coronavírus.

França: retomada voluntária

A França iniciou a retomada, de forma voluntária, na primeira quinzena de maio, priorizando Ensino Infantil e Fundamental. No final de junho, a volta foi obrigatória para todos os alunos de Fundamental e Médio, ainda que por apenas duas semanas – pois logo se iniciaram as férias de verão por lá.

Alemanha: retomada em etapas

Já na Alemanha, nação que, assim como a Coreia do Sul, foi considerada uma das referências no combate ao novo coronavírus, a reabertura oficial se deu mais tarde, nas primeiras semanas de agosto, e de forma faseada por estados (alguns voltarão apenas no início de setembro).

Os protocolos alemães incluem medidas bem definidas de distanciamento social e higiene, escalonamento de aulas, e em muitos estados, o uso de máscaras também é obrigatório. No entanto, mesmo com esse cuidado, duas escolas do norte do país precisaram fechar novamente, por conta da confirmação de novos casos de Covid-19 entre estudantes e professores.

Reino Unido: campanha do governo

No Reino Unido, o governo chegou a fazer campanha para a reabertura das escolas, com ministros discursando sobre a importância das aulas presenciais. As escolas reabriram as portas no início de junho, com mudanças que afetaram também a pré-escola. Em vez de assistirem às aulas sentadas lado a lado no carpete, as crianças foram acomodadas em carteiras, um modelo de sala de aula menos interativo. Todas as salas são equipadas com álcool gel e lenços umedecidos.

As aulas foram programadas para que apenas parte do corpo discente e docente esteja presente ao mesmo tempo na escola. Um grupo frequenta as aulas de segunda e terça, o outro de quinta e sexta-feira. Na quarta-feira, cada sala de aula é limpa passa por uma limpeza minuciosa.

As aulas foram interrompidas no meio de julho, seguindo o calendário escolar para férias de verão. Agora, o primeiro-ministro Boris Johnson quer retomar a todo custo as aulas em setembro, mas um estudo publicado em agosto aponta a alta possibilidade de uma segunda onda do novo coronavírus no inverno (no Hemisfério Norte), duas vezes maior que o primeiro surto, se não houver um sistema de teste e rastreamento rigoroso implementado.

Fonte: https://novaescola.org.br/conteudo/19681/reabertura-das-escolas-o-que-podemos-aprender-com-a-experiencia-de-outros-paises-na-pandemia#

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